O segredo do open banking, o que não te contaram?

Por: Tatiana Nogueira

Nas duas últimas semanas o que mais se escuta no meio bancário e que provavelmente você já viu alguma publicidade na mídia televisiva ou nas sociais é o tal do OPEN BANKING, que traduzido para o português significa banco aberto, ou no caso, sistema financeiro aberto. O projeto do Banco Central do Brasil tem inspiração na experiência britânica, pois sistema do open banking é o pioneiro e alguns outros países como Austrália, Índia, Estados Unidos, Canada e Rússia já implementaram aos seus sistemas financeiros.

Nas palavras de João André Pereira, Chefe Do Departamento de Regulação do Sistema Financeiro do Banco Central o Open Banking é “uma forma de compartilhamento de informações, serviços e produtos do sistema financeiro pra benefício da sociedade, para benefício do cidadão e a critério do cidadão.”[1]

A ideia central do open banking é dar ao consumidor o controle das informações e decidir o que fazer com elas, pois hoje só a instituição financeira em que está vinculado detém acesso. O Consumidor poderá escolher quais informações compartilhar, a que momento compartilhar e com quem compartilhar podendo retirar a autorização a qualquer tempo, sem aviso prévio.

Na prática[2] será assim: João é cliente do banco Y, faz a solicitação de cotação empréstimo por meio do aplicativo ou internet banking do banco W; O banco W aciona o banco Y para ter acesso às informações financeiras por João; O banco Y pede autorização de João para compartilhar seus dados com o banco W e quando João autorizar (e somente após essa autorização expressa) o banco Y enviará os dados para o banco W, dessa forma o banco W conseguirá apresentará uma cotação customizada a partir do histórico de João, pois poderá saber seu padrão de consumo, suas preferências e oferecer serviços que realmente se enquadrem ao perfil de João e tudo isso a custo zero, ou seja, o banco transmissor, no caso do nosso exemplo o banco Y, não poderá cobrar João pela informações repassadas ao Banco W.

O Brasil seguindo a tendência de estimular a concorrência, promover a eficiência e estimular a criação de novos e melhores produtos ao consumidor final iniciou em 01/02/2021 uma agenda de implementação do sistema financeiro aberto que será composta por 4 fases ao qual o Bacen[3] define como:

1ª Fase 01/02/2021: compartilhamento padronizado das informações sobre canais de atendimento, serviços e produtos financeiros tradicionais;

2ª Fase 15/07/2021: Consumidores terão o controle para compartilhar os dados (dados cadastrais, transações em conta, informações sobre cartões e operações de crédito) e compartilhá-los com as instituições de sua preferência se, e quando quiserem;

3ª Fase 30/08/2021: Consumidores terão acesso a serviços e propostas de crédito não apenas nos canais das instituições financeiras;

4ª Fase 15/12/2021: Ampliação do conceito de Open Banking para incluir mais opções de dados que poderão ser compartilhados.

Todas as instituições financeiras com porte superior a 1% do PIB são obrigadas a participar do Open Banking, pode-se, portanto, concluir que os 5 principais bancos com operações no Brasil já aderiram ao sistema financeiro aberto. Para as instituições financeiras com o PIB inferior a 1% a adesão é voluntária.

Mas depois de tudo isso, será mesmo que esse Sistema Financeiro Aberto contemplará toda a população? Aqueles que infelizmente não possuem um bom histórico, ou estão começando agora a sua relação com um banco, ou aqueles que não possuem uma renda expressiva e aqueles que não possuem conta corrente ou poupança, mas precisam de crédito, como ficam diante do novo sistema?

Um estudo feito por Gustavo Schainberg S. Babo[4] expõe o quão discriminatório pode ser o algoritmo[5] que avalia as métricas para oferecer o produto mais adequado. De acordo com os dados apresentados pelo cliente, o sistema definirá quais serviços ofertar com base no histórico e é aí que mora o problema, dependendo da situação, o sistema pode julgar se o cliente é de risco e apresentar taxas de juros mais elevadas, ou até mesmo não apresentar nada ao cliente por entender que ele não se encaixa com o “perfil da instituição”.

Infelizmente essa discriminação existe e pode se perpetuar no Open Banking, ainda mais se levarmos em conta a última pesquisa publicada pelo CNC[6] que em janeiro de 2021 concluiu que 66,5% dos brasileiros estão endividados, correndo inclusive o risco de violar o princípio da não discriminação, disposto no art. 6º, IX da Lei Geral de Proteção de Dados nº 13.709/2018.

Outro estudo feito pela pesquisadora do Instituto Propague Joana Vaccarezza[7], agora a respeito do Open Finance (sistema aberto do Reino Unido) em operação desde 2018, também traz observações a respeito da discriminação algorítmica em suas palavras:

“Outro ponto crítico é que, se bem a disponibilidade de informações sobre os usuários pode levar à oferta de produtos de investimento mais adequados a cada cliente, também pode levar à exclusão daqueles usuários cujo perfil não é interessante às instituições do mercado. Estudos recentes sobre a discriminação algorítmica apenas reforçam o cuidado necessário à aplicação da inteligência artificial à criação de perfis de usuários.

Nesse mesmo sentido, a nova regulação deve evitar que a personalização dos produtos baseada em dados leve à diferenciação de preços de forma que as instituições cobrem tarifas excessivas dos clientes mais vulneráveis. Isto é particularmente perigoso no mercado de seguros. Se as seguradoras, com base nas informações compartilhadas pelos próprios consumidores, cobrarem preços excessivamente altos dos clientes identificados como de maior risco, estes podem ficar excluídos do mercado.

A adesão ao Open Banking precisa ser muito consciente, pois a falta de educação financeira entre a população[8] pode afetar a oferta de serviços que serão vantajosos para o consumidor.

Então antes de autorizar o uso do seu histórico bancário, estude sobre o assunto, avalie os impactos dessa exposição, pois num primeiro momento pode ser interessante apresentar a outras instituições as informações para auferir vantagens, mas ao mesmo passo pode ser que o banco ofereça um juro bem mais alto, ou um produto bem mais caro por julgar que é um risco ter tal consumidor constando na carteira de clientes.

[1] www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/openbanking

[2] https://openbankingbrasil.org.br/2021/03/25/o-que-e-open-banking-2/

[3] https://openbankingbrasil.org.br/?cookie=true

[4] Graduando do 3° período de Direito e Ciências do Estado. Jovem selecionado para representar o Brasil no fórum da ONU Internet Governance Forum pela ISOC em Paris. Pesquisador em Direito e Novas Tecnologias na UFMG. Membro e Youth da Internet Society. Membro do Centro de Pesquisas DTI BR. Global Shaper do Hub de Belo Horizonte. Interessado nas áreas de Direito, Neurodireito, Tecnologia, Inovação, Internet, Inteligência Artificial e Empreendedorismo.

[5] Um algoritmo é apenas um conjunto de instruções sobre como realizar uma tarefa. Eles variam de simples programas de computador, definidos e implementados por seres humanos, a sistemas de inteligência artificial muito mais complexos, treinados com terabytes de dados.

[6] https://fecomercio-rs.org.br/2021/02/23/cnc-2021-comeca-com-mais-brasileiros-endividados/

[7] https://institutopropague.org/noticias/open-finance-debates-sobre-o-futuro-do-sistema-financeiro-britanico/#:~:text=No%20Reino%20Unido%2C%20o%20Open,de%20contas%20que%20fazem%20pagamentos

[8] https://institutopropague.org/noticias/open-finance-debates-sobre-o-futuro-do-sistema-financeiro-britanico/#:~:text=No%20Reino%20Unido%2C%20o%20Open,de%20contas%20que%20fazem%20pagamentos.

www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/openbanking

 

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Tatiana Nogueira é advogada e sócia da Harpia  Soluções Financeiras compõe a equipe jurídica e de negociação de dívidas da Empresa. Pós-graduanda em Direito Civil e Empresarial pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus Perfil completo Linkedin.

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