Por: Tatiana Nogueira
Virou consenso popular que posso devolver em 7 dias toda e qualquer compra de produtos ou serviços, porém essa premissa não é totalmente verdadeira e explicaremos o porquê, mas primeiro vejamos o que diz a redação do artigo 49, do CDC:
Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio. (grifo nosso)
Repare que o caput do artigo garante claramente o exercício do direito de arrependimento, como o próprio código chama de “prazo de reflexão” de 7 dias contados da data da assinatura ou do recebimento do produto ou serviço, SEMPRE que a contratação tenha sido realizada FORA do estabelecimento comercial, ou seja, quando se tenha usado qualquer outro meio ao qual o consumidor não teve contato direto com o produto ou serviço no ato da compra.
O texto do artigo faz menção a contratação por telefone e domicilio, mas se faz necessário estender a aplicabilidade para as compras feitas pela internet, onde literalmente se está a um clique do produto ou serviço desejado.
O prazo de 7 dias para exercício do direito de arrependimento passa a valer da data em que se recebeu o produto/serviço, a devolução pode ser feita sem a necessidade de justificativa e a empresa é obrigada a arcar com os custos dessa devolução, bem como a ressarcir o valor pago corrigidos monetariamente, conforme disposto no parágrafo único do mesmo artigo, senão vejamos:
Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados. (grifo nosso).
E quanto as compras feitas no próprio estabelecimento? Nesse caso, não há previsão legal que obrigue nenhum lojista a receber o produto de volta. O legislador entendeu que como a pessoa foi até a loja, viu o produto, manuseou não tem por que após sete dias se arrepender. Agora o que se acontece na prática é a famosa “política de fidelização do cliente” em que a empresa, por mera liberalidade, ou seja, por LIVRE VONTADE, resolve conceder um prazo de “troca” caso o produto no prazo estipulado por eles que pode ser de quantos dias julgarem interessante (já vi prazo três, cinco e até sete dias) apresente algum vício ou defeito, após essa data, apenas via assistência técnica, mas isso é assunto para um próximo artigo.
Quanto as companhias aéreas, o auto índice de reclamação das taxas absurdas de cancelamento, fez com que a ANAC editasse a resolução nº 400/2016 da ANAC, para conceder ao usuário o “prazo de reflexão” da seguinte forma:
Art. 11. O usuário poderá desistir da passagem aérea adquirida, sem qualquer ônus, desde que o faça no prazo de até 24 (vinte e quatro) horas, a contar do recebimento do seu comprovante.
Parágrafo único. A regra descrita no caput deste artigo somente se aplica às compras feitas com antecedência igual ou superior a 7 (sete) dias em relação à data de embarque. (grifo nosso).
Observe que nesse caso o prazo é mais curto e em relação ao CDC e pasmem, a resolução é de 2016 e representa um retrocesso as garantias do consumidor e é por isso que tanto a doutrina como o entendimento dos Tribunais[1] são contrários a resolução, por dois motivos claros: 1 – A existência do dever constitucional à proteção aos direitos do consumidor, visto este ser a parte vulnerável da relação de consumo e 2 – o Código de Defesa do Consumidor é Lei Geral e Especial e tem força maior que se sobrepõe a resoluções que são normas infralegais[2] sobre a ótica da teoria geral direito.
Com o cenário pandêmico os números de voos foram reduzidos em todo o país, gerando uma série de remarcações, cancelamentos e transtornos. Na tentativa de solucionar esse problema no dia 05 de agosto de 2020 foi promulgada a Lei nº 14.034 , com a seguinte redação no artigo 3º:
Art. 3º O reembolso do valor da passagem aérea devido ao consumidor por cancelamento de voo no período compreendido entre 19 de março de 2020 e 31 de outubro de 2021 será realizado pelo transportador no prazo de 12 (doze) meses, contado da data do voo cancelado, observadas a atualização monetária calculada com base no INPC e, quando cabível, a prestação de assistência material, nos termos da regulamentação vigente. (Redação dada pela Medida Provisória nº 1.024, de 2020)
Na prática em virtude do período pandêmico prolongado, as companhias aéreas continuam cancelando voos, e facilitando a remarcação em outros voos, mas cuidado quando optar por cancelar passagem, pois como o caput do artigo 3º aduz que o valor pago pode ser devolvido em até 12 meses e se porventura este for o seu caso, observe que este valor precisa ser corrigido monetariamente.
Atente-se ao detalhe, por ser uma lei de caráter especial com vigência apenas em um espaço curto de tempo, consumada a data final (31/10/2021), o prazo que valerá para reembolso das passagens canceladas durante o exercício do direito de arrependimento será de 24 horas, salvo nova norma legal dilatando o prazo.
Em suma, o direito de arrependimento ou prazo de reflexão é apenas para compras feitas fora do estabelecimento comercial e caso você tenha feito alguma compra dentro da loja e o vendedor informar um prazo de troca, saiba que é uma politica da empresa visando um bom relacionamento com o cliente e no caso das passagens aéreas, fique atendo ao prazo. Se você teve um voo cancelado entre os dias 19 de março de 2020 a 31 de outubro de 2021 e as opções apresentadas de remarcação não eram viáveis e optou pelo reembolso da quantia paga, a companhia aérea em caráter especial pode devolver a quantia em até 12 meses contados da data do cancelamento do bilhete.
Consumo bom é consumo consciente.
[1] https://www.tjdft.jus.br/consultas/jurisprudencia/jurisprudencia-em-temas/jurisprudencia-em-perguntas/onus-da-prova-direito-do-consumidor/direito-de-arrependimento/o-direito-de-arrependimento-previsto-no-cdc-para-compras-a-distancia-e-aplicavel-a-aquisicao-de-passagens-aereas-pela-internet#:~:text=Aquisi%C3%A7%C3%A3o%20de%20passagem%20a%C3%A9rea%20pela,conclu%C3%ADdos%20por%20meio%20da%20internet.
[2] Item 3 <https://jus.com.br/artigos/73280/a-hierarquia-das-normas-e-sua-inobservancia#:~:text=A%20ILEGALIDADE%20OU%20INCONSTITUCIONALIDADE%20DE,)%2C%20sob%20pena%20de%20invalidade.>
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Tatiana Nogueira é advogada e sócia da Dívidas & Soluções compõe a equipe jurídica e de negociação de dívidas da Empresa. Pós-graduanda em Direito Civil e Empresarial pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus Perfil completo Linkedin.
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